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NEUZA LADEIRA
(1950, Nasceu em Belo Horizonte, Minas Gerais)
Artista plástica, poeta, ativista /presa política 1970/72k CEFET-MG.
Autora dos livros Opúsculos, Anome/ 2003; Quarto de Dormir Quarto de Pensar, Urbana, 2008; Poética Caderno I, Catitu/Série os Azuis, 2013.
MELLO, Regina. Antologia de Ouro IV. Museu Nacional da Poesia / Organização Regina Mello. Belo Horizonte, Arquimedes Edições, 2016. 160 p. 15 x 21 cm. ISBN 978-85-89667-56-2
Ex. bibl. Antonio Miranda, enviado pela editora.
A Caravana
Somos viajantes em curso
A paz está aqui só que não vemos
Alegres ou tristes como um grande lago
Ilimitados sussurrando baixinho
Recolhendo as correntezas e vicissitudes da vida
Abundantes perturbados altivos vergados
Caldeirões de impulsos ora alto ora baixo
Devoradores da opressão do progresso gradual
Penetração encontro reunião
Diminuição dilatação
No insondável na duração na retirada
***
Os versos se movem
Talvez o seu íntimo
Derrama
Ele sabe e eu também
Que oco está
Ele me disse que ficaria assim
Já pediu socorro
Já rezou terço
Para se livrar de si
A culpa chegou na infância
Nasceu marcada
Distorcida e míope
Não nascia
A mãe sofreu
Os abusos da dor
Só as horas importam
Tem hora para tudo
Início e fim
Em tudo transparecem
AI-5. Belo Horizonte, MG: Baroni Edições, 2016. 72 p. 14 x 21 cm. Inclui poemas de Biláh Bernardes, Helenice Maria Reis Rocha, Irineu Baroni, Petrônio Souza Gonçalves, Rogério Salgado. 72 p.
Ex. bibl. Antonio Miranda
Quarto de hotel
Se viu confinada
Foi ali naquele lugar que seu laço se estreitou
com a ideologia que defendia
*
Clandestina com nova identidade
O medo entrou fundo e suava frio
Nauseada segurava o grito com as mãos
E se a mulher não voltasse
Sem dinheiro sem poder sair
Uma vida que dizem
Ser nova se instala
Dali pra frente era se outra
Teria que se desfazer da imagem antiga
Era procurada com retrato no jornal
A mulher apareceu
Foi comigo comprar roupas pintar os cabelos
Transformar-me
Se antes era distraída deveria ser atenta
Uma polícia inteira nos cassava
Fiquei cinco meses clandestinos
As baixas eram enormes
Muitos numa leva desta foram presos
A violência começou no veículo falavam mal
Gritavam nos ofendiam
Chega a prisão tudo pantanoso
Foi ali naquele martírio
Em cima de duas latas cortando os pés
Com os fios de choque pelo corpo
E com aqueles homens
Que uivavam
Os prisioneiros em volta
Estavam ou no pau de arara nu
Sendo espancados
Ninguém contava com ninguém
Defendia-se como podia
Ficávamos à mercê
De homens sistemáticos
Éramos objetos bonecos
Você despojada
Sua vida é deles
A mente se encontra confusa
Mesmo destroçada
O sono era picotado
Num ato de extremo sadismo
Os loucos o açoitaram
O grito surgiu dos lábios secos e feridos
Um urro um jato de urina uma névoa NL
Um suborno da razão do outro
o corredor polonês
Este encapsulado sofrimento humano
em assistir ao sofrimento do outro...
Esta dor estrangeira
A percussionista escuta sente a banqueta
de madeira em suas extremidades
O som não vinha do carrilhão,
mas do medo no suor do cansaço da tuba.
Maracás estridentes
de um lado a outro do pelotão
Chocalhos barras cilíndricas de madeira
e borracha
Claves guizos e chicotes.
Como ópera um teatro
Não previa o espetáculo
Algo inesperado retaliado
onde a boneca se move
Naquele corredor de homens sistemáticos
Tudo verde oliva.
Bonés cobrindo no grito a ordem do quartel
Tire a roupa
E entre aqui no meio
Ande para lá e para cá!
Você me escuta
Isto é o corredor polonês
Que fizeram comigo
um dia antes do julgamento
Aquelas mãos passante
A maior humilhação
A princípio até questionou
exigiu seu direito argumentou
Que há muito se encontra detido
e se veio de outra prisão por aquilo
O AI-5 estava para protegê-los
Depois do AI-5 as coisas foram insustentáveis. Quando saíamos da cadeia não tínhamos nada, não arrumávamos emprego, não tínhamos Folha-Corrida, Atestado de Bons Antecedente. Éramos párias. Foram as nossas famílias que nos ampararam.
*
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Página ampliada em novembro de 2021
Página publicada em fevereiro de 2021
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